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Defasagem em tabela impulsiona arrecadação milionária de cartórios no ES
 
15.09.2021   A Gazeta
Notícia - Imprensa

Quem compra um imóvel de R$ 200 mil, a maioria, paga as mesmas taxas de quem adquire uma mansão de R$ 2 milhões. CNJ já cobrou posicionamento do TJES

Se quando você ouve falar em cartório já pensa em algo burocrático e chato, pode não estar de todo enganado. Mas há uma queda de braço travada no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), envolvendo interesses de responsáveis por cartórios, construtoras e do próprio Judiciário que condensa muitas emoções. Principalmente porque tem a ver com algo que dói no bolso, provavelmente no seu.

Em 2001 uma lei estadual estabeleceu os valores a serem pagos aos cartórios por quem compra imóveis no Espírito Santo. Definiu-se que quem compra um imóvel mais caro paga taxas mais caras. Faz sentido, certo?

Ocorre que a Lei n° 6.670/2001 estabelece faixas de valores de imóveis, sendo que os mais caros, no topo da tabela, são os acima de R$ 200.000,01. Naquele ano, um apartamento de R$ 200 mil era coisa de rico. Hoje em dia, não mais. Mas a tabela continua a mesma.

Ou seja, quem compra um apartamento de R$ 210 mil, por exemplo, paga as taxas de valor máximo aos cartórios, se quiser deixar tudo “de papel passado”. Arca com as mesmas taxas que uma construtora que compra um terreno de R$ 12 milhões desembolsa.

E se a tabela que escalona o valor dos imóveis não foi atualizada, o mesmo não se pode dizer do valor das taxas, os chamados emolumentos, que são corrigidos anualmente, pelo Valor de Referência do Tesouro Estadual (VRTE), ficando cada vez mais altos.

Na prática, pessoas de classe média baixa e de classe média estão sendo penalizadas ano a ano.

“A pessoa que comprava um imóvel de R$ 200 mil em 2001 pagava R$ 1 mil para registrar o imóvel e mais R$ 1,6 mil para lavrar a escritura, dava R$ 2,6 mil tudo. Hoje quem compra um imóvel de R$ 200 mil paga R$ 5,5 mil para registrar e outros R$ 6,6 mil para lavrar a escritura. Dá R$ 12 mil”, exemplifica o vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Espírito Santo (Sinduscon-ES), Aristóteles Passos Costa Neto.

“Não faz sentido uma pessoa que está comprando um imóvel de R$ 210 mil pagar R$ 12 mil em emolumentos. Quem compra um imóvel de R$ 500 mil, de R$ 1 milhão, paga os mesmos R$ 12 mil, porque é o teto. Para quem compra o imóvel de R$ 1 milhão, R$ 12 mil pode não ser uma quantia tão significativa, mas para quem compra um imóvel de R$ 200 mil é”, complementa.

Muitas vezes, essas pessoas deixam de lavrar as escrituras dos imóveis e se contentam com “contratos de gaveta”.

O CNJ concedeu, no mês passado, um novo prazo para que o TJES se manifeste a respeito da correção da tabela de emolumentos.

A coluna ouviu o Sinduscon, um diretor do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado do Espírito Santo (Sinoreg-ES) e um membro do Judiciário. Todos concordam que a tabela tem que ser atualizada. Por que então isso não ocorre? É o que tentaremos responder aqui.

Cada um tem seus termos, ninguém quer perder receita. Não por acaso, os cartórios que mais arrecadam são os de registros de imóveis. Frise-se: nem todos os cartórios têm alta arrecadação e arrecadação não é a mesma coisa que lucro.

“Nossa ideia é mexer não no valor do teto, mas em quem vai pagar o teto, que seriam pessoas que compram imóveis acima de R$ 800 mil, não são a maioria”, diz o vice-presidente do Sinduscon.

Ou seja, menos pessoas, compradores de imóveis, pagariam o valor máximo das taxas. Logo, em tese, os cartórios arrecadariam menos. E o que o Sinduscon, as empresas construtoras, têm com isso? Elas são afetadas indiretamente. Quando alguém compra um apartamento da construtora e não lavra a escritura, por exemplo, o imóvel continua no nome da empresa. O contrato de compra e venda apara boa parte das arestas legais, mas não todas.

“O impacto das medidas que a gente está pleiteando é para a sociedade. As empresas não pagam esses custos e sim nossos clientes. Nossos clientes não fazem as escrituras. Existe uma retenção enorme de pessoas que estão com documento provisório”, diz Costa Neto.

DE ONDE VEM O DINHEIRO
O dinheiro arrecadado pelos cartórios, não somente os de imóveis, mas os cartórios em geral, também chamados de serventias extrajudiciais, não vem dos cofres públicos e sim dos emolumentos, das taxas que as pessoas que utilizam os serviços pagam.

Mas parte dessa arrecadação vai para o poder público. Por exemplo, no Espírito Santo, 10% do que um cartório arrecada são destinados ao Fundo Especial do Poder Judiciário estadual.

A Corregedoria do TJES chegou a propor, em 2019, a atualização da tabela, por meio de um projeto de lei a ser enviado à Assembleia Legislativa. Para isso, no entanto, o texto precisa, primeiro, passar pelo crivo do Pleno do TJES, que reúne todos os desembargadores da Corte.

Essa parte está emperrada. Entidades que representam os responsáveis por cartórios também apresentaram propostas. “Existe pressão dos dois lados: do Sinduscon, para isso andar, e dos cartórios, para que isso não ande”, confidenciou um magistrado à coluna.

Diretor de Registro de Imóveis do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado do Espírito Santo (Sinoreg-ES), André Arruda rebate:

“A pressão não é nossa. Entendemos todos que a tabela tem que ser atualizada. O Tribunal de Justiça que não mexe com essa tabela porque teme a perda dos valores dos fundos especiais. A gente quer atender a população. O sistema Judiciário depende desses valores e não quer perder.”

Diretor de Registro de Imóveis do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado do Espírito Santo (Sinoreg-ES), André Arruda rebate:

"Os cartórios são nesta briga o siri entre o rochedo e o mar"

Considerando que parte da arrecadação dos cartórios vai para o próprio Judiciário, poderia não haver interesse do Tribunal em mexer nesse vespeiro.

“O Tribunal está praticando injustiça social por conta de sua receita? Talvez”, diz Costa Neto, do Sinduscon.

O magistrado ouvido pela coluna avalia, no entanto, que tem jeito de melhorar as coisas e ninguém sair perdendo: ao ajustar a tabela para que proprietários de imóveis de pouco mais de R$ 200 mil, que são a maioria, paguem uma taxa menor, há o incentivo à lavratura de escrituras e ao registro dos imóveis, o que manteria a receita.

O QUE DIZ O TJES
A coluna demandou o TJES, ainda na última sexta-feira (10), mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

Tive acesso, no entanto, ao que o Tribunal informou ao CNJ. O Conselho foi acionado pelo Sinduscon quanto à demora da Corte em oferecer um posicionamento sobre a atualização da tabela de emolumentos.

“O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo noticiou que ‘o procedimento administrativo que trata da questão tramita em meio físico, e que os prazos processuais dos processos que tramitam em meio físico estão suspensos desde 18 de março de 2020’’, registrou a corregedora nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura, em decisão do dia 28 de agosto.

Ela concedeu 90 dias, na ocasião, para que o TJES dê prosseguimento ao caso. Não é a primeira vez, no entanto, que mais prazo é concedido. "Ficamos neste limbo. O CNJ dá mais prazo e o Tribunal de Justiça não cumpre o prazo", resume o diretor jurídico do Sinduscon, Carlos Augusto da Motta Leal.

Entenda
- Os cartórios não são órgãos públicos e, por isso, não recebem dinheiro dos estados ou da União. O valor arrecadado por eles vem das taxas pagas pela população para registro de firma, títulos ou imóvel, por exemplo. Ou seja, todo o dinheiro vem de serviços que são prestados e pagos pelos clientes no balcão.

- Apesar de a arrecadação de alguns cartórios ser alta, e ultrapassar a casa dos milhões durante o ano, boa parte desse dinheiro não fica com o responsável pela serventia. No Espírito Santo, 10% vão para o Fundo Especial do Poder Judiciário; 5% vão para o Fundo Especial do Ministério Público; 5% para o Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública e outros 5% para o Fundo de Modernização da Procuradoria Geral do Estado. Há também tributos incidentes, como o ISS, que vai para os municípios. O restante fica para o cartório e deve ser usado para manter a própria serventia, pagar funcionários e a remuneração do responsável.

- O titular de um cartório deve ser aprovado em concurso público para exercer a função. Essa é uma exigência da Constituição de 1988. O aprovado, no entanto, não passa a ser servidor público e sim delegatário de uma função pública. Pode receber acima do teto do funcionalismo, que é de R$ 39,2 mil mensais.

Letícia Gonçalves

https://www.agazeta.com.br/colunas/leticia-goncalves/defasagem-em-tabela-impulsiona-arrecadacao-milionaria-de-cartorios-no-es-0921

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